Me lembrei esses dias de quando tinha apagão. A fubazada toda ia pra rua queimar bom bril, gritar e se esconder na casa dos outros . E, claro , sempre haviam os mais saidinhos que preferiam muito mais se esfregar no escuro com alguém do que ver lã de aço queimar girando em alta velocidade.
Também durante os apagões,aconteceram momentos maravilhosos da infância das crianças da minha época. Acontece que os pais costumavam contar histórias de um outro tempo, de outras perspectivas de vida e oportunidades,mas mesmo as historias tristes rescendiam a alegria. E mesmo os relatos de momentos de dificuldade motivavam, inspiravam e exortavam a uma reflexão e à uma diretriz de vida preciosa que minha mãe me transmitiu: A gratidão!
“No meu tempo não tínhamos isto…. No meu tempo não tínhamos aquilo…No meu tempo fazíamos assim…” e mesmo eu, que sempre fui avesso a esse tipo de “propaganda” ouvia hipnotizado histórias de um tempo que eu não vivi ,mas que era tão meu,por ter nele a história dos meus, de onde eu vim.
Cessavam-se as guerras, contendas e demandas. Eram momentos de pura transmissão ancestral de conhecimento, era o retorno, era a tribo ao redor da fogueira, a perpetuação dos laços. Sem a tecnologia , que nos aproxima do que está longe, e nos afasta do que está perto, os filhos eram filhos, e os pais eram pais, e tudo adotava uma postura mais harmônica.
Não que eu tivesse muita escolha,pois como não haviam tantas velas assim em casa , éramos meio forçados a permanecer juntos num mesmo cômodo. Mas hoje, eu percebo que eu permaneceria voluntariamente ,pra mais uma xícara, de uma pacífica noite, como pacíficas eram as noites de apagão.